Por Thales Fonseca, Head da PowerHub e da solução da Way2 para GD | 31 maio, 2019 | 0 Comentário(s)
Cenários da geração compartilhada de energia
O compartilhamento de carros, casas e roupas já é uma realidade. Recentemente o conceito de Geração Compartilhada de energia chegou ao setor elétrico com a Geração Distribuída e junto, o desafio de gerir a compensação de créditos.
É notório que a sociedade tem questionado e transformado hábitos antigos no que se refere ao modo de consumir. Cada vez mais as pessoas querem simplesmente suprir suas demandas, sem necessariamente adquirir um produto. Esse modelo sugere uma dinâmica de negócios onde o acesso é mais importante do que a posse. O compartilhamento de bens como carros, casas e roupas já é uma realidade da economia compartilhada, chamada ainda de economia colaborativa. Esse conceito também se encaixa no setor de energia, com a Geração Distribuída, mais especificamente com a geração compartilhada de energia.
No Brasil, a Geração Distribuída surgiu em 2012, quando a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) publicou a Resolução Normativa 482, estabelecendo as bases para instalação e conexão de usinas de micro e mini geração distribuída. Foi um passo importante para o País, pois criou-se ali a possibilidade de um consumidor gerar sua própria energia, abater o montante gerado do seu consumo e ainda obter créditos (em kWh) por eventuais excedentes injetados na rede da concessionária, podendo abatê-los de faturas posteriores.
Em 2015, após longos debates com o setor e a sociedade, a ANEEL publicou a Resolução Normativa 687, elencando melhorias na legislação, o que tornou a Geração Distribuída ainda mais atrativa para os consumidores. Além de estender a validade dos créditos de energia de 36 para 60 meses, a Resolução 687 criou os conceitos (ou modalidades): que inseriram de fato a energia elétrica no universo da economia compartilhada.
Modalidades de Geração Distribuída
A modalidade Empreendimento com Múltiplas Unidades Consumidoras permite que moradores de condomínios residenciais ou comerciais gerem energia elétrica no condomínio, tanto para abater o consumo das suas dependências, quanto da área comum.
O Autoconsumo Remoto é a possibilidade de o consumidor produzir energia em um imóvel e consumir os créditos em outro, desde que ambos sejam atendidos pela mesma concessionária. Com isso, pessoas que têm casas de veraneio, mas moram em edifícios, por exemplo, podem instalar o sistema de geração em sua casa e consumir os créditos em seu apartamento.
Já a Geração Compartilhada de Energia é a possibilidade de a unidade consumidora onde está instalado o sistema de geração distribuída compartilhar parte dos créditos com outros consumidores, podendo ainda determinar o % de energia que deverá ser destinado a cada unidade.
Portanto, a Resolução 687 trouxe duas grandes vantagens no que se refere à compensação de créditos:
- A usina de geração distribuída não precisa estar necessariamente no local de consumo, podendo ser instalada em qualquer ponto da área de concessão da distribuidora;
- A energia gerada pode ser compensada em um ou mais pontos de consumo remoto, desde que usina e unidades consumidoras estejam registrados no mesmo CNPJ ou CPF.
Dessa forma, a legislação passou a permitir que unidades consumidoras pudessem se reunir por meio de consórcios (no caso de pessoas jurídicas) ou cooperativas (no caso de pessoas físicas) a fim de compartilhar o investimento em uma usina de geração distribuída e produzir sua própria energia. Fazendo uso, então da geração compartilhada de energia.
Redução de custos “por assinatura”
Um dos exemplos de modelos de negócio pautado nesses avanços da Resolução 687, que certamente vai ajudar a impulsionar a expansão da Geração Distribuída no país, permite a obtenção dos benefícios da economia e sustentabilidade mediante uma espécie de assinatura mensal.
O consumidor “aluga” parte de uma usina, que está longe da sua casa ou empresa, e usa a geração dela para abater do seu consumo. O valor mensal do aluguel somado à conta de energia acaba sendo menor do que o valor da conta original, representando uma economia entre 10% e 20%.
As principais vantagens desse modelo são:
- Condições ideais de instalação: no caso de uma planta solar, por exemplo, um terreno plano e sem sombreamento facilita a obtenção da maior eficiência possível, reduzindo custos e melhorando a performance;
- Economia de escala: ao invés de investir sozinho, você investe juntamente com outras unidades consumidoras, viabilizando usinas de maior porte, com maior capacidade de geração, que custam menos por cada kilowatt gerado;
- O&M especializado: geralmente o O&M é feito por profissionais especializados, otimizando a disponibilidade e a geração da usina, diferente de um sistema instalado em casa ou em uma empresa;
- Retorno imediato: redução na conta de energia já no primeiro mês, sem a necessidade de investimentos iniciais.
Já existem vários desses projetos avançando em todas as regiões do Brasil (destaque para o estado de Minas Gerais), com usinas dimensionadas para atender redes de lojas, agências bancárias, farmácias, postos de gasolina e também residências e condomínios.
O desafio da gestão de créditos de energia
Os modelos de negócio descritos são atraentes e de fato representam possibilidade de economia. Mas um fator importante nesse cenário é a necessidade de realizar mensalmente o balanço energético entre a energia gerada pela usina e a energia creditada nas várias unidades consumidoras reunidas no consórcio ou cooperativa, a fim de auditar o sistema de compensação de créditos. Esse processo é fundamental, pois tanto a energia injetada na rede quanto a compensada nas unidades consumidoras são medidas e processadas pelas concessionárias, que podem cometer equívocos e afetar o resultado esperado.
Além disso, como o critério para a divisão da energia excedente é livre e cabe a cada consórcio ou cooperativa definir o percentual que será alocado a seus integrantes, esse % pode ser alterado a cada ciclo de faturamento, desde que notificada com 60 dias de antecedência, tornando complexa a gestão dos créditos para uma operação otimizada, que resulte na maior economia possível para o grupo de consumidores envolvido.
Nesse contexto, o balanço energético vai consistir na avaliação das parcelas ou fluxos de energia envolvidas no processo de compensação de energia a partir de dados de medição e das faturas emitidas pelas concessionárias.
E como acompanhar de forma eficaz o sistema de compensação de créditos?
No caso da energia gerada pela usina, uma solução viável e efetiva para obtenção e validação dos dados de geração é a utilização de um sistema de monitoramento baseado na telemedição do medidor da concessionária ou de um smart meter independente que medem exatamente a energia líquida injetada na rede.
Todavia, a alternativa de telemetria ainda não se viabiliza em escala no lado dos consumidores, e a parcela de geração de cada consumidor, obviamente, não é gerada fisicamente no local de consumo. Portanto, é imprescindível a análise mensal da fatura de energia de cada unidade para se obter os parâmetros para o balanço energético e consequentemente para auditar a compensação dos créditos.
Isso significa extrair da fatura de cada unidade, mensalmente, a medição da energia consumida no período, a parcela da energia injetada na rede pela usina destinada a tal unidade, a energia compensada, ou seja, aquela abatida do consumo no período, e o saldo atual de crédito, cujo valor já considera a compensação ou acúmulo realizado no período, dependendo se a parcela da energia gerada pela usina, e destinada aquela unidade, foi menor ou maior que o consumo.
Agora imagine realizar a extração dessas informações das faturas, e a checagem do processo de compensação através do balanço energético, para dezenas, centenas ou até milhares de unidades consumidoras reunidas no compartilhamento de uma usina de GD. Para que esse processo não se torne um fardo operacional, sujeito a erros, ou até para que viabilize o modelo de negócio é preciso adotar uma abordagem sistemática.
Digitalização e análise automática de faturas de energia
Tecnologias que automatizam a digitalização e a análise das faturas de energia através do processamento das contas disponibilizadas em formato de pdf pelas distribuidoras, estão se mostrando como a solução mais viável, técnica e financeiramente, para auditoria do processo de compensação e acompanhamento da evolução dos créditos.
Os arquivos são extraídos de e-mails enviados pela própria concessionária ou capturados via software “robô” que se autentica no portal da concessionária usando o login/senha de cada unidade consumidora e faz o download da conta em pdf.
Então são processados e os dados de energia creditada são comparados com a geração realizada pela usina ponderada pelo % de participação de cada unidade consumidora no consórcio ou cooperativa. Além disso, essas análises implementam ainda a inteligência necessária ao controle dos saldos de créditos, que subsidiarão eventuais decisões de alteração dos % destinados a cada unidade.
Por isso, os benefícios esperados com a adoção desta abordagem sistemática sobre a gestão da compensação de energia são:
- Identificação de erros da distribuidora que impactam na economia mensal de cada unidade integrante do projeto;
- Redução de custos de gestão através da automação da importação, validação e gerenciamento das contas de energia das unidades;
- Criação de valor para o consumidor, assegurando confiabilidade e transparência no modelo de negócio.
Gestão eficiente para assegurar potencial econômico
A geração compartilhada de energia é uma tendência que ainda tem muito a crescer, possibilitando cada vez mais autonomia e liberdade para os consumidores buscarem meios próprios de otimizar sua forma de consumir energia. No entanto, o aproveitamento dos benefícios que essa modalidade de consumo proporciona será assegurado apenas diante de uma gestão adequada dos processos envolvidos, entre eles a gestão dos créditos de energia gerados e compensados.
A tecnologia deve ser vista como uma aliada nesse contexto, pois permite que empresas otimizem seus processos, agreguem confiança em suas operações e diminuam seus riscos, encurtando, com isso, o caminho para chegar à pretendida economia no negócio.