À medida que o tempo passa, os grandes saltos tecnológicos que transformam a humanidade acontecem em intervalos mais curtos de tempo. A história da tecnologia é marcada por uma aceleração exponencial. Foram 120 anos entre o início da Revolução Industrial e o surgimento das máquinas a vapor, em 1760, e a invenção da lâmpada elétrica, em 1880. Mais 89 anos e surgiam os primeiros computadores com acesso à Internet, em 1969. Adicione apenas 38 anos e chegamos à era dos smartphones com o lançamento do Iphone em 2007.
18 anos depois, vivemos na era da Inteligência Artificial generativa e se você optar por passar duas semanas sabáticas na bela serra catarinense, propositalmente desconectado das notícias do Mundo, provavelmente ficará desatualizado sobre o surgimento de algum novo modelo de IA, mais autônomo, poderoso e integrado à sua rotina pessoal e profissional.
O setor elétrico parece caminhar para um paralelo semelhante. Não no mesmo ritmo, é bem verdade, mas se 2025 marcou os 30 anos do início do processo de abertura de mercado no Brasil, iniciado no longínquo ano de 1995, os últimos meses movimentaram os aspectos regulatórios como a tempos não se via. Se você foi um pouco mais ousado e estendeu o período sabático nas montanhas de Santa Catarina por alguns meses, além de lhe invejar, preciso dizer que muita coisa aconteceu. Entre CPs, MPs e (a esperada) sanção da Lei 15.269, todos os setores da cadeia de conversão de energia foram impactados. E o final do ano de 2025 fica marcado como o período de definição de algumas das maiores mudanças do setor elétrico nos últimos anos.
Na sopa de letrinhas e números do setor elétrico, dois nomes devem se tornar mais conhecidos e batizar este marco regulatório de 2025: a NT Conjunta 17/2025 da Aneel (NT 17/25) e a Lei 15.269/2025 (Lei 15.629/25).
A NT 17/25 da Aneel trouxe a avaliação das contribuições recebidas na Consulta Pública nº 07/2025 (saiba mais sobre a CP 07/25 aqui). Dentre todos os temas que receberam contribuições, destaque para dois deles: a simplificação do processo de migração do ACR para o ACL e a proposta de instituição de um modelo de Open Energy no Brasil.
O conteúdo sugere a simplificação do processo de migração para o Mercado Livre, alterando o processo operacional de um consumidor que pretende ir para o ACL. A proposta indica que o consumidor pode optar por manifestar o interesse através de comunicação formal à Distribuidora ou por celebrar um Contrato para Comercialização Varejista (CCV) e deixar que a sua representante informe à Distribuidora o seu interesse em migrar para o ACL através do novo modelo simplificado instituído pela CCEE (sobre o novo modelo simplificado da CCEE, saiba mais detalhes aqui). Ainda sobre o processo de migração, a Distribuidora por sua vez segue com um prazo de 5 (cinco) dias para responder às solicitações de migração sob a possibilidade de ser impedida de faturar o consumo de energia elétrica do consumidor em caso de não cumprimento e atraso na resposta.
As propostas de simplificação de migração reforçam a necessidade de uma operação com base em um pilar de digitalização, com ferramentas de tecnologia se colocando como imprescindíveis para sustentar os processos tanto do lado da Varejista quanto do lado da Distribuidora (saiba mais aqui).
A NT 17/25 também ficará marcada como o documento que orientou a instituição do Open Energy (entenda mais sobre o Open Energy aqui). A temática foi, inclusive, a que recebeu maior número de comentários dos agentes e mercado na CP 07, sendo objeto de 26% do total de contribuições. A proposta abrange de forma completa as orientações para que as ações que viabilizam a abertura de dados do setor elétrico sejam instituídas, possibilitando o compartilhamento e acesso aos dados em duas etapas: acesso aos próprios dados pelo consumidor (1ª etapa – não antes de 2027) e compartilhamento dos dados após consentimento através de APIs (2ª etapa – não antes de 2028).
Com exemplos bem-sucedidos de outros mercados, como o financeiro que opera com sucesso o Open Banking, o Open Energy deve ser um marco de transformação tecnológica no setor elétrico. O compartilhamento de dados vai estimular o desenvolvimento de novos produtos e serviços, ampliar a transparência e a competitividade e pode resultar em melhores condições para os consumidores. A transação de dados de energia exige uma série complexa de digitalização de processos e integrações. A boa notícia é que o modelo sugerido é maduro e coloca a tecnologia no centro.
Já a Lei 15.629/25 foi a conclusão da Medida Provisória 1304, e impactou toda a cadeia, dos geradores aos consumidores. Entre vetos de artigos relacionados aos cortes de geração e ressarcimento de renováveis (saiba mais sobre o curtailment aqui) e estabelecimento de regras que devem moldar a matriz energética, como a prorrogação da concessão das usinas de carvão mineral, contratação de novas PCHs e inserção das baterias no jogo, a lei enfim define o cronograma oficial para abertura completa do mercado. Consumidores comerciais e industriais do Grupo B estarão aptos a migrar em novembro de 2027, enquanto os residenciais terão acesso ao ACL em novembro de 2028.
A escala muda e o mercado também, clamando por soluções que otimizem o desafio operacional de lidar com milhões ao invés de milhares de dados. O Brasil inicia o processo de se tornar um dos maiores mercados livres nacionais do Mundo. Em uma espécie de Plano JK do setor elétrico, o que se espera é que vamos viver 30 anos em 3. No médio prazo, até 2028, teremos uma corrida pela migração de clientes varejistas, abertura dos dados de energia e equilíbrio entre fontes de geração e demanda. O plano de fundo é a digitalização, necessária para habilitar o salto de maturidade do nosso mercado em uma transformação tecnológica que promete ser exponencial.