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Por Danilo Barbosa, diretor de Marketing e Produtos da Way2 | 9 maio, 2019 | 0 Comentário(s)

Do Open Banking às Open Utilities: os dados no setor elétrico

Com o Open Banking empresas autorizadas podem realizar operações bancarias de forma segura a partir de integrações diretas com o banco. E se os consumidores de energia pudessem também ter e dar acesso a seus dados?

dados no setor elétrico

Sabemos que um setor está em transformação quando altos executivos dão entrevistas e utilizam termos técnicos. Hoje no setor bancário só se fala em APIs, ou Application Programming Interfaces, um conjunto de interfaces padronizadas para integração entre sistemas, através das quais um sistema pode consultar dados e realizar operações em outro sistema.

O conceito é fundamental para o Open Banking, termo que resume o movimento de abertura dos bancos a integrações com terceiros. Desta forma, Fintechs e outras empresas alavancam os serviços dos bancos, ou de qualquer outra instituição financeira, incorporando-os a suas próprias aplicações e interfaces.

Por exemplo, um aplicativo de gestão financeira pode integrar em um só lugar seus lançamentos em diversas contas bancárias e indicar que seus gastos com restaurantes estão superiores aos de 80% das pessoas com a mesma faixa de renda, um efeito do Open Banking e é só o começo.

Abertura de dados no Setor Elétrico

É cada vez mais comum, dentro do próprio Setor Elétrico, que empresas de tecnologia tenham APIs para facilitar integrações entre sistemas. Elas homologam aplicações de parceiros para que a integração exija o mínimo de dificuldade para o usuário, ou o mínimo de atrito, no jargão mais utilizado. Para dar um exemplo bem próximo, diversas parceiras acessam as APIs do serviço de medição para usinas da Way2, mediante autorização pelo usuário.

São empresas como a Delfos, que utiliza os dados para análise preditiva de falhas em turbinas, ou diversas aplicações de Gerenciamento de Contratos, que conseguem desta forma um acompanhamento de exposição em tempo real durante todo o mês. Além das parceiras, integrações para portais corporativos e ferramentas de Analytics também se conectam diretamente às APIs.

Já o consumidor de energia, pelo menos no mercado regulado, não conta com esta facilidade. As distribuidoras disponibilizam sites e aplicativos com seus dados. Porém, são formas antigas de acessos. Muitas exigem o login em cada Unidade Consumidora isoladamente, o que dificulta a vida de clientes corporativos.

E no melhor dos casos, são interfaces amigáveis para acesso por um ser humano, não por outras aplicações. Algumas tem bloqueios de segurança que impedem o acesso por qualquer forma de robô. Independentemente da qualidade do acesso, nenhuma das distribuidoras poderia dar a um varejista a visão integrada do consumo de todas as suas unidades espalhadas pelo Brasil, ou analisar se um agregado delas, apesar de individualmente menores, poderia ir para o Mercado Livre.

Apesar de, segundo pesquisa da ANEEL realizada junto às distribuidoras (e divulgada na Nota Técnica n°0084/2017-SRD/ANEEL), já na época do levantamento mais de 80% das unidades consumidoras atendidas em Alta Tensão contarem com telemedição, os dados disponibilizados ao consumidor são focados no faturamento, ficando disponíveis somente ao final de cada ciclo mensal.

Estes consumidores tem a opção de fazer uma telemedição paralela no próprio medidor da concessionária, e muitos o fazem. Mas notem que ele está pagando duas vezes pelo sistema de leitura. Um é comprado para si, e outro para a concessionária. Para consumidores atendidos em Baixa Tensão, esta alternativa deixa de ser viável.

Evidentemente, o Setor Elétrico vai além das distribuidoras. A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE, por exemplo, já conta com um gateway de APIs para consulta a diversos serviços, incluindo dados dos Consumidores Livres, tendo sido bastante pioneira nesta iniciativa. Mas é nas distribuidoras que a maioria dos dados de consumidores se concentram, e naturalmente onde haveria maior impacto com esta modernização.

Regulação na abertura de dados e serviços

Em mercados competitivos como o bancário, muito do movimento acontece de forma espontânea. Bancos digitais e fintechs fazem parcerias buscando se diferenciar no atendimento aos clientes, sem uma necessidade de investimentos exorbitantes, e veem a monetização de APIs ou dos serviços que elas proveem como parte do negócio.

Mesmo assim, a regulação tende a seguir os movimentos espontâneos, e normatizar aspectos como segurança, escopo dos serviços ou até detalhes de implementação. Uma das principais premissas do open Banking é que os dados são do consumidor, e não da instituição financeira. Esta foi a base para que, no início de 2018, a União Europeia tenha obrigado os bancos a criar APIs, suportando serviços de pagamento e garantindo abertura e controle dos dados pelos clientes.

A partir da normativa PSD2 – sigla para a segunda Diretriz de Serviços de Pagamento – todos os bancos são obrigados a aderir, independente do seu tamanho ou estratégia digital. No Brasil, o Banco Central também está normatizando o Open Banking, com expectativa de implementação em 2019.

No Setor Elétrico, a característica de operação regulada das distribuidoras não traz as pressões da competição que levaram pelo menos parte dos negócios em outros setores a abrirem os primeiros serviços de integração para terceiros.

É da lógica do setor que a ANEEL avalie a possibilidade de uma normativa similar ao Open Banking, dando aos consumidores a possibilidade de controle dos seus dados. A mesma premissa de que o cliente é o “proprietário” dos dados, está inclusive na nova Lei Geral de Proteção de Dados pessoais (lei 13.709/18 – LGPD, art. 17), à qual todas as empresas tem que se adaptar.

As APIS são só a forma mais moderna de fazê-lo. Não se trata de forma alguma de um tema trivial. Há várias formas de regulamentar a questão, desde a mais detalhada, entrando em aspectos técnicos de implementação para garantia de interoperabilidade, ou credenciamento das empresas habilitadas a utilizar tais recursos, etc. Até formas descomplicadas, garantindo serviços mínimos e aspectos de segurança, e deixando os detalhes de implementação a critério de cada empresa.

Aplicações dos dados de energia

Em muitos aspectos, os dados de consumidores de energia são como dados bancários. Com APIs que possibilitem a um cliente dar acesso a seus dados, uma rede do varejo, por exemplo, poderia suportar a análise de crédito automática com base no histórico de bom pagador das contas de energia. Sistemas contábeis poderiam ter acesso detalhado às informações, sem necessidade de digitação, separando impostos, custos de energia, multas, ou qualquer outro aspecto relevante para o controle contábil e gerencial, de forma automática.

Empresas focadas na Gestão de Energia poderiam unificar o controle de informações de diferentes distribuidoras, se especializar em diferentes aspectos da gestão, como projetos de eficiência energética, sem ter que instalar medições paralelas, ou pelo menos sem necessidade de duplicar a medição da distribuidora. Empresas de Geração Distribuída poderiam realizar diagnósticos baseados no consumo de forma muito mais fácil, praticamente sem gerar atrito para o consumidor interessado.

Outras aplicações podem envolver a própria estrutura de funcionamento do Setor Elétrico, como por exemplo, no mercado varejista de energia. Suponha a figura de um agente agregador de medição, responsável por concentrar e validar dados de consumidores de menor porte, agrupando a informação antes de alimentar a contabilização realizada pela CCEE. A existência de APIs para terceiros nas distribuidoras já resolveria a questão técnica de acesso aos dados pelos “Agentes Agregadores”, visto que se trata somente de um caso especial no universo de empresas terceiras integradas.

Conclusão

O uso de APIs para abertura de dados e serviços leva a experiências mais integradas para o consumidor, e maior competitividade em diversos setores da economia. O setor bancário, com o movimento de Open Banking, vem passando por esta transformação, e pode ser considerada uma referência para o Setor Elétrico.

São empresas que lidam com volumes similares de clientes e informações bastante sensíveis, endereçando aspectos de segurança críticos. Pela característica regulada e não concorrencial do setor, é natural que a ANEEL normatize a questão para que os consumidores tenham controle do acesso aos seus dados.

Há diversos benefícios potenciais na abertura: melhorias de qualidade e competitividade nos serviços associados à gestão de energia; análises de crédito ou diagnósticos associados a aplicações como Geração Distribuída, de forma muito mais fácil e democrática; e inúmeras outras aplicações podem surgir da possibilidade de conexão entre as empresas do Setor Elétrico e aplicações de outros segmentos. O importante é a premissa por trás da tendência: os dados são do consumidor. Garantindo que ele possa ter controle sobre o acesso, mais aplicações virão.

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